Horácio: Mãe – Fabio Coala

O Horácio é um dos meus personagens favoritos do mestre Maurício de Sousa. Eu sempre admirei a sua feição delicada, os seus olhos, que conseguem expressar tantos sentimentos em pequenos detalhes e, especialmente, a sua personalidade reflexiva, em que busca entender a sua existência e tudo o que lhe rodeia, gerando momentos filosóficos belíssimos. A imagem icônica do personagem em minha mente é dele, sentado à beira de um penhasco, olhando para o céu, para o infinito. 

No texto introdutório dessa HQ, Maurício de Sousa revela que, desde o lançamento do selo Graphic MSP, em outubro de 2012, fez um pedido ao editor Sidney Gusman, responsável pelo selo, para que não usasse o personagem. Horácio havia se tornado uma extensão de seu criador, um meio de expressar seus pensamentos e a sua compreensão da vida, e ele queria protegê-lo ao máximo.


Eu só posso agradecer que ele tenha mudado de ideia, pois a obra Horácio: Mãe, escrita e desenhada por Fabio Coala, é emocionante e nostálgica, trazendo a essência do personagem em uma jornada de busca pela sua mãe, que se torna uma experiência de encontro de um sentido para a vida, de construção de laços de amizade e do amadurecimento em momentos difíceis.

Em seus primeiros momentos na história, vemos Horácio buscando se aproximar de outros dinossauros. Entretanto, ele não é um simples dinossauro, é um filhote de Tiranossauro Rex. Nem desconfiam de que é vegetariano, bondoso e que deseja um amigo, mas a sua condição de predador o afasta de todos. Uma das leis nesse ambiente é que os maiores comem os menores, mas Horácio se sente diferente dos demais de sua espécie e não quer se tornar mais um. 

É tocante como o autor nos mostra a tristeza nos olhos do personagem, a sua solidão e a angústia em se sentir deslocado no mundo, por não saber se a sua mãe está viva e o que ocorreu para que esteja abandonado. Em uma página em especial, o autor nos presenteia com quadros recortados e unidos em uma espiral, para demonstrar como os dias se repetem para Horácio, em sua busca por alimento, a fuga de predadores, a tentativa de contato com outros seres e, por fim, o descanso solitário e melancólico em uma árvore ou em uma caverna. Uma representação maravilhosa da prisão em que o personagem se encontra.


Cansado de esperar por respostas, Horácio decide então procurar por sua mãe. E, a partir disso, seu caminho se cruzará com dois personagens, Napinho e Tecodonte, que também se encontram perdidos em meio a um ambiente hostil, formando um grupo que acompanhará Horácio em sua caminhada. 

A aproximação entre os três personagens é recheada inicialmente de desconfianças e medo, porém, à medida que cada um demonstra quem realmente é, as barreiras vão sendo quebradas e o olhar muda, permitindo a Horácio descobrir pela primeira vez o que é uma amizade. 

Ele amadurece e, principalmente, ensina aos seus novos companheiros que eles são capazes de muito mais do que possam imaginar, independentemente de seu tamanho ou força. Como nosso querido dinossauro afirma: “O medo faz as coisas parecerem piores do que são. ”. Sem que percebam, os seus amigos passam a agir de formas diferentes, substituindo os receios pela confiança. Um momento muito especial é quando um desses personagens fala, com irritação, de todos os riscos que Horácio está passando em tentar salvar alguém da morte e como isso é inútil enquanto, ao mesmo tempo, o próprio colega inconformado se põe ao salvamento que tanto criticou, uma feliz contradição. 

O autor é muito hábil em nos mostrar esse crescimento do grupo e como isso os levará a uma mudança, transformando a indiferença e o temor em coragem para arriscar as suas próprias vidas em defesa dos mais fracos.  

E, nesse processo, as qualidades de Horácio ficam ainda mais evidentes. Ele é destemido, sábio, sensível. Ele tem medo, mas segue e mostra o caminho aos amigos, não os deixando desamparados. Enfrenta inimigos mais fortes e não recua. Não se conforma com quem lhe diz que não vale a pena se importar com os outros, que a busca pela mãe é sem sentido. Quantos ensinamentos gigantescos esse pequeno dinossauro nos oferece...

O autor Fabio Coala merece elogios. Construiu uma história com uma estrutura simples, investindo em diálogos inspirados e na força dos personagens, todos cativantes. Seus traços são bem definidos e as expressões de cada dinossauro explodem sensações no leitor. Sentimos a alegria, a tristeza, a dor, o esforço, o medo, a esperança. A lágrima que se forma nos olhos de Horácio, e que nos captura completamente. Há momentos de humor, especialmente com Napinho e seu medo de ser comido a todo momento. É impossível não se apaixonar pelos personagens. 

Ao longo da história, a jornada do personagem é intercalada com a jornada de sua mãe, em que cada trecho contado deixa um ponto em aberto, aumentando o suspense quanto aos próximos acontecimentos. Mais um ponto positivo para o autor.


O desfecho da HQ é comovente, trazendo uma revelação simples, porém sublime, permanecendo em nossa mente por muito tempo. Se há algo a criticar nessa HQ, é somente a falta de mais páginas e o desejo de continuar na história.

A edição que tenho é de capa dura, de excelente acabamento. Os extras são bem interessantes, mostrando a evolução do desenho de cada personagem e os testes de capas, além de nos apresentar a primeira tira em que o Horácio apareceu, na Folha de São Paulo, em 1961.

O que torna Horácio mais que um dinossauro é o seu desejo de construir um sentido para a sua existência, a sua capacidade de amar e de estender as mãos (no caso, as patinhas) ao próximo, e a esperança inabalável. Tudo o que nós, humanos, devemos buscar em nossas breves passagens por esse planeta. 

Hum...será que a vida é só isso? Andar, comer, fugir, dormir...Todos os dias, todos fazem as mesmas coisas, sem nunca nem pensar no porquê. Sinto que falta algo. É como se eu não me encaixasse no mundo.
Daqui de cima, as coisas parecem fazer mais sentido. Tudo é tão harmonioso.
Talvez esse seja o sentido. Fazer parte...do seu jeito. 

Nota: 5/5★♥
Livro no Skoob: Horácio: Mãe

Nenhum comentário

Tecnologia do Blogger.