Como Nossos Pais


Nós ficamos tão acostumados com os grandes blockbusters que mais vezes do que nos damos conta acabamos por não dar o devido valor para as histórias comuns. Eu sempre gostei de dramas que contam os conflitos cotidianos de pessoas e famílias normais e é com essa temática que Laís Bodanzky, diretora de filmes como “O Bicho de Sete Cabeças” e “As Melhores Coisas do Mundo”, volta a brilhar com “Como Nossos Pais”.

Pra começar, desde o trailer eu achei brilhante a escolha do nome do longa, pois “apesar de termos feito tudo que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais”. O atemporal hino de Belchior que foi eternizado na voz única de Elis Regina cai como uma luva para esse filme, que trata dentre outros assuntos principalmente dos problemas de família e dos atritos entre mãe e filha, do choque de gerações e do momento onde as diferenças se encontram em semelhanças.


A cena de abertura me chamou a atenção com uma bela fotografia que de fora transporta você para dentro da dinâmica de um típico almoço de domingo em família, no qual a aparente harmonia vai de despedaçando rapidamente quando comentários incitam uma tensão que culmina no conflito que vai desencadear todas as problemáticas desenvolvidas no roteiro. A clara falta de entendimento entre Rosa (Maria Ribeiro) e sua mãe (Clarisse Abujamra) faz com que uma discussão  termine na revelação que servirá como a última gota d’água que faltava para sua vida finalmente transbordar em crise.

Um dos grandes acertos do filme é abordar a temática da super mulher, a que tenta exercer todos os papéis - de mãe, filha, esposa, profissional -  ao mesmo tempo e com uma perfeição inalcançável até o momento em que percebe que está submersa numa jornada impossível que a sufoca aos poucos, assim dando de cara com uma crise que pesa mais do que o já imensurável peso de todas as responsabilidades que carrega sozinha. Seu conflito de identidade a faz questionar toda a sua vida ao longo dos seus 38 anos e coloca em foco seus atuais  problemas conjugais com Dado (Paulo Vilhena), pai ausente e marido pouco participativo; levantando questionamentos sobre o impacto da tecnologia nos relacionamentos, sobre o papel de relacionamentos tradicionais na sociedade e sobre a abdicação de sonhos em prol das obrigações.

Me incomodou um pouco algumas transições de cenas bruscas para outras cenas que pareciam já estar em andamento, principalmente no começo do filme. Há também uma cena em inglês que ficou pouco convincente e que faltava o apoio de legendas, o que não sei se seria uma simples falha um talvez algo que me soou um pouco pretensioso. Outra cena fez parecer que o acesso a um Ministro fosse fácil, tornando a solução pouco crível. Mas num geral, minha humilde opinião de público,  posso dizer que o filme é feito de muito mais acertos do que falhas.

O longa desenvolve bem as temáticas propostas e chega a um ponto em que apresenta tantas que pensei que iria se perder, mas conseguiu abranger a tudo com uma visão extremamente fácil de criar identificação e ainda permeando assuntos como feminismo, desejo, flerte com transgressão, de maneira bastante humana e real. Impossível não exaltar a performance de Maria Ribeiro, que muito semelhante a sua personagem, carrega grande responsabilidade nas costas liderando esse elenco, dando o tom do filme, e entrega uma interpretação excepcional.


Ganhador do 45º Festival de Cinema de Gramado, “Como Nossos Pais” é um cinema nacional fresco e moderno, um drama que emociona ao mesmo tempo em que incomoda e que me fez deixar a sala de cinema ontem com muito sobre o que pensar. Recomendo.


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